Entre os problemas que a pandemia do novo coronavírus vem incitando está o aumento do número de casos de depressão e suicídio. Psiquiatras veem um agravamento das doenças mentais neste período em várias partes do mundo.

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Na Itália, um homem de 65 anos tirou a própria vida ao se jogar da janela do hospital em que estava aguardando o diagnóstico para a Covid-19. Nos Estados Unidos, uma médica chamada Lorna Breen, de 49 anos, cometeu suicídio após forte pressão em seu trabalho na linha de frente da doença.
Mas não são apenas pessoas afetadas pela Covid-19 que entraram nas estatísticas. Confira entrevista com a psicóloga Jane Célia Rodrigues (concedida ao Pleno News) sobre o problema e sua extensão:
Antes de falar sobre a pandemia, como a depressão pode ser diagnosticada e tratada?
A depressão não deixa marcas, o diagnóstico não é fácil de ser fechado. Não existem exames laboratoriais específicos para diagnosticar a depressão, confundidos com uma tristeza normal, os sintomas podem passar despercebidos. O diagnóstico é clínico do psiquiatra após coleta completa da história do paciente e realização de um exame do estado mental pode avaliar o grau, sintomas e motivos da depressão.
Como o Brasil está na luta contra a depressão?
Segundo a OMS, 121 milhões de pessoas sofrem de depressão em todo o mundo, é a quarta principal causa de incapacitação. O Brasil que ocupa o primeiro lugar no ranking.
Há uma preocupação maior com pessoas com depressão por causa da pandemia?
No Brasil, além da pandemia obrigar uma quarentena, a população ficou imersa em uma disputa política, em fake news, em uma instabilidade que gerou muito conflito e insegurança. Isso levou muitos a desenvolver ansiedade e até mesmo a depressão devido ao estresse emocional.
Então o fato da pessoa estar em isolamento social pode acarretar num quadro depressivo?
É um conjunto. Fatores de risco podem contribuir para o desenvolvimento da depressão, como histórico familiar, transtornos psiquiátricos correlatos, estresse crônico, ansiedade crônica, disfunções hormonais, dependência de álcool e drogas ilícitas, traumas psicológicos, doenças cardiovasculares, endocrinológicas, neurológicas, neoplasias, entre outras.
Conflitos conjugais e mudança brusca de condições financeiras e desemprego também são fatores de risco. Os fatores de risco como o estresse, ansiedade e mudança brusca de condições financeiras e desemprego são aqueles que mais poderão concorrer para que na quarentena as tentativas de suicídio ou mortes para o suicídio aconteçam.
Mas todos os casos de suicídio neste período podem ser relacionados com a pandemia e a quarentena?
Não. Em épocas de pandemias as informações e dados podem se elevar camuflando as demais doenças. Mas, evidências científicas comprovam que pode haver um aumento tanto das tentativas quanto do suicídio consumado em tempos de pandemia. De acordo com um estudo em Michigan e divulgado pelo Loudwire, o índice de pessoas que se matam cresceu 32% durante a quarentena.
Em um recente artigo publicado, o diretor-geral da OMS, escreveu que a Covid-19 poderia trazer outra epidemia, segundo ele: uma epidemia de transtornos de estresse, depressão e ansiedade. A previsão está se confirmando.
Levando em consideração a análise do diretor-geral da OMS, podemos afirmar que o problema do suicídio na pandemia é global?
Além do estudo de Michigan, nos Estados Unidos, a Itália viu aumento no número de pessoas que tiram suas vidas para não ter de enfrentar a Covid-19, como o idoso de 65 anos de Pávia e duas enfermeiras jovens que tiraram a vida por não aguentarem a pressão da doença.
Uma delas trabalhava no hospital de Jesolo, no Vêneto, e tinha 49 anos. Ela estava em isolamento domiciliar havia dois dias e esperava o resultado do teste e assintomática, mas não foi capaz de lidar com a tensão extrema e se lançou no rio Piave. Os colegas e as pessoas que a conheciam descreveram-na como uma pessoa dedicada ao trabalho e muito atenta às exigências dos outros e concluem que quem tirou-lhe a vida foi o medo, junto ao cansaço, à solidão, ao isolamento, à dor por aquilo que via em torno de si. Além desses, um idoso da cidade de Lecce tentou se matar e foi salvo em cima da hora.
Mas os casos não se limitam apenas a doentes ou profissionais de saúde, certo?
O medo tem consequências tremendas no sujeito, é pessoal, podendo afetar diferentemente as pessoas. Leva à depressão, que é uma condição psicológica e tem um efeito nocivo sobre o sistema imunológico e sobre as defesas do organismo no confronto de infecções. Quando paramos para refletir sobre a quarentena, nos vem à pergunta: quem são os que estão em quarentena? Pessoas em grupo de risco, pessoas com suspeita, pessoas que tiveram contato com os infectados e hoje muitos vivendo em lockdown.
Mas nos esquecemos de que entre aqueles que estão em quarentena, há os doentes mentais. Há aqueles que moram sozinhos ou que precisam estar sozinhos. Há famílias e pessoas preocupadas com a saúde e com o seu emprego. Há principalmente aqueles que já perderam seus empregos. Há todo um grupo de pessoas afastadas do convívio social com seus familiares, amigos e até mesmo do convívio empregatício. O Covid19 tem disseminado vidas, mas, o medo tem sido o pivô de algumas perdas. O medo é o causador principal do crescimento dos sintomas da ansiedade na população, não diferente em meio à pandemia que os obrigam ao afastamento social, principalmente nos portadores dos transtornos mentais.
Como o medo da Covid-19 precisa ser administrado pela pessoa?
O medo faz parte das emoções do ser humano, podendo ser positivo ou negativo dependendo do momento do sujeito. O medo negativo é causado por insegurança, medo do desconhecido, medo do futuro. Podemos concluir que o medo está presente na vida de muitos nesta quarentena e o afastamento social está contribuindo.
Como os órgãos de saúde estão lidando com esta problemática?
O Ministério da Saúde lançou uma pesquisa para saber como a população em geral, incluindo profissionais de saúde estão lidando com a pandemia para tentar ter um retrato mais assertivo e poder intervir com mais cuidado. Também a Fiocruz têm elaborado materiais de apoio psicológico para auxiliar os profissionais e os serviços a atuarem para minimizar o sofrimento das pessoas. A Rede de Atenção Psicossocial foi orientada a reforçar seus espaços para escuta e atendimento.
Além disso, em alguns locais foi implementado o serviço de telemedicina com inclusão do apoio psicossocial com psicologia para dialogarem e encaminhar para os serviços de referência, se for necessário, a pessoa que pode estar em maior risco. A telemedicina é um recurso para atendimento e tratamento à distância. É feito a partir da identificação de pacientes com síndromes gripais ou que já tenham diagnóstico por Covid-19. A nível nacional o número recomendado é 136.
Os profissionais de saúde mental estão tendo dificuldades de tratar os pacientes por causa do distanciamento?
Os psicólogos, psicoterapeutas estão trabalhando e auxiliando através das consultas online. Por outro lado, a população precisa estar atenta às informações verídicas. É preciso tomar conhecimento sobre o vírus. Muitos não querem saber como atua a Covid-19, alguns por medo e ficam expostas as falsas informações. Quando tomamos ciência do perigo, será muito mais fácil lutarmos ou evitarmos esse perigo. A Covid-19 pode ser evitada quando nos prevenimos.
E como as pessoas ao redor podem ajudar?
Entre tantas outras maneiras de apoio, a população precisa compreender que mesmo não estando no convívio social as quais estão impossibilitadas no momento, precisam ficar atentas sobre como podem ajudar uns aos outros e a si mesmo.
Fonte: Pleno News